10/05/2022 - TCU aponta os principais problemas na gestão tributária federal entre 2015 e 2021.
Com mais de 377 mil normas tributárias editadas após a promulgação da Constituição Federal, em 1988, o Brasil possui um dos sistemas tributários mais complexos e burocráticos do mundo. Para contribuir com o debate em torno da Reforma Tributária, o Tribunal de Contas da União (TCU) se debruçou sobre os principais problemas encontrados nas auditorias sobre a gestão tributária federal realizadas pelo Tribunal entre 2015 e 2021.
O resultado é a edição do relatório “Conclusões Técnicas dos trabalhos realizados na Gestão Tributária Federal” que traz, de forma objetiva e clara, uma análise dos dados mais relevantes colhidos nas auditorias feitas na Receita Federal do Brasil, no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, na Secretaria do Tesouro Nacional, no Ministério da Economia e no ext into Ministério da Fazenda.
O contencioso
Considerado uma medida indireta da qualidade do sistema tributário de um país, o contencioso tributário no Brasil, com seu elevado número de contestações na esfera administrativa ou judicial, demonstra a complexidade e a dificuldade que o Brasil tem enfrentado na gestão desse sistema nos últimos anos.
O volume de recursos envolvidos no contencioso chama a atenção. Em 2019, havia, somente nas Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento (DRJs), 265.350 processos com valores gerais da ordem de R$ 135,31 bilhões. No Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), os valores em discussão eram da ordem de R$ 671,93 bilhões nos 117.034 processos existentes. Já no estoque da Dívida Ativa da União (DAU), o valor chegava a R$ 2,32 trilhões para quase 17 milhões de inscrições.
A demora x o retorno para a União
O tempo médio para a análise do contencioso administrativo é muito longo no Brasil. Nas delegacias da Receita Federal é de dois anos e sete meses. No Carf, a conclusão do contencioso leva cerca de quatro anos. Já na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), a execução fiscal dura aproximadamente nove anos.
Mesmo depois de toda a demora, apenas 5% do valor das autuações retorna aos cofres do Tesouro Nacional (TN), aqui considerados os Programas de Recuperação Fiscal (Refis).
A burocracia tributária
Bem conhecida por boa parte dos brasileiros, a burocracia tributária tem um custo para todo o Brasil. Ela prejudica o contribuinte, o ambiente de negócios e afeta a competitividade das empresas brasileiras. A análise do TCU revela uma quantidade muito grande de normas tributárias existentes.
Em 2017, havia mais de 26 mil normas tributárias em vigor nas três esferas de governo. Desde a promulgação da Constituição Federal, em 1988, 377 mil normas foram editadas (32 mil delas só no âmbito federal).
O Tribunal aponta ainda divergências de interpretação das normas legais relativas à administração tributária federal em nível administrativo e judicial. Outro problema levantado pelo TCU é a falta de documento que compile a legislação tributária vigente, conforme exige o art. 212 do Código Tributário Nacional (CTN).
Burocracia em números
377 mil normas foram editadas após a promulgação da Constituição Federal em 1988 (32 mil delas são federais).
Mais de 26 mil normas tributárias em vigor nas três esferas de governo em 2017.
3 mil atos foram editados pela Receita Federal do Brasil com possível impacto na vida dos contribuintes.
797 horas por ano é o tempo gasto para cumprir as obrigações tributárias no Brasil, segundo dados de 2018 do Banco Mundial.
474 horas por ano é a quantidade de horas que um estudo da Federação Nacional das Empresas de Serviços Contábeis (Fenacon) disse ser necessário para cumprir as obrigações tributárias no Brasil, em 2019.
Veja a íntegra do relatório
A gestão do crédito tributário
Um levantamento realizado pelo TCU, em 2016, para avaliar os riscos e os controles internos da gestão do crédito tributário pela Receita Federal do Brasil, apontou a existência de 1,5 milhão de processos que envolviam R$ 603 bilhões. Quase a metade, 46%, estava na fase de contencioso administrativo, 30% em acompanhamento judicial (controle do crédito sub judice), 19% em parcelamento fazendário e os 5% restantes em parcelamento pendente ou em revisão de ofício.
Sobre os créditos inscritos em Dívida Ativa da União (DAU), o TCU ressalta que entre 2000 e 2017 foram editados cerca de 28 programas de parcelamento tributário (Refis) com possibilidade de parcelamento em prazos muito dilatados.
Para o TCU, os dados analisados indicaram dois aspectos relevantes:
Há elevadas chances de devedores da União estarem optando pelo Refis para se esquivar de outras estratégias de cobrança.
Entidades empresariais estariam utilizando parcelamentos especiais como mecanismo de rolagem de dívidas, devido às recorrentes edições desses programas.
Auditorias financeiras
O TCU, em parceria com a Controladoria-Geral da União (CGU), realizou auditoria para avaliar a confiabilidade e a transparência das demonstrações contábeis de 2017 do então Ministério da Fazenda (MF), com foco nas contas Créditos Tributários a Receber e Dívida Ativa da União.
A auditoria apontou que a Receita Federal do Brasil contabilizou indevidamente no ativo alguns créditos tributários de baixíssima probabilidade de recuperação. A consequência foi uma subavaliação do ativo de R$ 9,21 bilhões, após os devidos ajustes para perdas. Logo após essa auditoria, a Receita Federal do Brasil editou a Portaria RFB 1.343/2018, que limitou o acesso do TCU a alguns dados sigilosos.
Ainda assim foram identificadas as seguintes falhas:
Receita Federal do Brasil
Demora nos processos compromete a cobrança administrativa.
Atraso no reconhecimento do ajuste para perda em créditos tributários a receber.
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Impossibilidade de atestar a totalidade dos valores de provisões para perdas judiciais e passivos contingentes.
Secretaria do Tesouro Nacional
Superavaliação em R$ 29,2 bilhões do estoque dos títulos da dívida pública interna.
Não contabilização de redução a valor recuperável das participações societárias avaliadas pelo MEP.
Superavaliação de R$ 1,48 bilhão no registro das obrigações referentes à Lei 8.727/1993.
Ministério da Economia
O TCU realizou auditoria financeira, em 2019, baseada nas informações registradas nas Demonstrações Contábeis do Ministério da Economia (ME) para o exercício e encontrou inconsistências nos valores da arrecadação federal e divergência das fontes oficiais:
Relatório do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros (Cetad) – Análise da Arrecadação das Receitas Federais em 2019: R$ 1,54 trilhão;
Siafi – Mainframe – R$ 1,33 trilhão;
Tesouro Gerencial – DVP do Ministério da Fazenda – R$ 1,29 trilhão;
e Balanço Orçamentário da RFB – Receitas Tributárias + Receitas de Contribuições: R$ 1,38 trilhão.
Em 2020, o Tribunal repetiu a auditoria financeira no Ministério da Economia que verificou as seguintes falhas:
Receita Federal do Brasil
Inconsistências na Fita 50;
Riscos de fragilização e/ou paralisação do projeto que integra o controle dos créditos previdenciários (PUC 02 - DCTFWeb);
Acumulação de valores sem correta identificação em virtude da sistemática do Darf Avulso
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
Não criação do GPCLAS;
Dados de entrada para cálculo do rating de devedores desatualizados;
Critérios excepcionais da Portaria AGU 514/2018 em desconformidade com as normas contábeis.
Evolução
O Tribunal de Contas da União destaca a evolução promovida pelo Ministério da Economia para permitir ao TCU o acesso aos dados protegidos por sigilo fiscal, necessários à execução das fiscalizações do Tribunal:
2018 – Portaria RFB 1.343/2018 instituiu o Protocolo de Auditabilidade.
2019 – Parecer 53/2019/CONSUNIAO/CGU/AGU constitui o acesso a informações protegidas por sigilo fiscal, por órgãos de controle externo e interno (TCU e CGU).
2020 – Assinatura do Convênio TCU/RFB estabelece regras para o compartilhamento de informações com sigilo fiscal, pela Receita Federal ao TCU. Já o Decreto 10.209/2020 trata da requisição de informações e documentos e sobre o compartilhamento de informações protegidas pelo sigilo fiscal.
2021 – Portaria 4/2021 atualiza o Protocolo de Auditabilidade da RFB.
Fonte: https://portal.tcu.gov.br/imprensa/noticias/tcu-aponta-os-principais-problemas-na-gestao-tributaria-federal-entre-2015-e-2021.htm